COMPAIXÃO

Marcos Pontes
08/08/2007

Todos nós precisamos de alguém algum dia. Por mais independente, dura, egoísta ou anti-social que a pessoa tenha se tornado na idade adulta, seja lá por qual razão, certamente esse mesmo adulto, hoje infeliz, já foi feliz um dia, quando criança. Já sentiu o amor de alguém. Já sentiu o carinho e a compaixão de outro ser humano, provavelmente a mãe ou o pai, que, por horas a fio, no meio da noite, carregou no colo, embalou e consolou o choro da criança assustada que adormeceu na calma do abraço seguro.
Muitas vezes não nos damos conta da importância de uma palavra de consolo, uma lembrança, um telefonema, uma palavra de motivação. Já notou que algumas vezes acordamos pensando em uma pessoa, alguém que não vemos há muito tempo. Passamos o dia lembrando desse amigo, com vontade de ligar para matar a saudade, colocar o assunto em dia, ou simplesmente perguntar: “tudo bem contigo?” É como se “alguém” estivesse nos dizendo alguma coisa. Porém, muitas vezes os afazeres da nossa rotina, ou o medo de ser interpretado como “esotérico”, nos impede de fazer aquela ligação.
Por outro lado, você já pensou que realmente aquela pessoa poderia estar precisando de sua ajuda, de uma palavra amiga, precisando “exatamente” de você como única e última esperança em um momento difícil da vida...e você não estava lá, não ligou?
Não tenha medo de parecer “esotérico”, “ultra-sensível”, ou qualquer coisa assim. Com certeza, isso não vai prejudicar a sua vida. Mas a sua omissão pode ser questão de vida e morte para alguém. Assim, ouça aos seus instintos, siga seu coração, tenha compaixão!
Muita gente confunde compaixão com pena. Contudo, essas são coisas muito diferentes.
Pena é um sentimento sem ação, normalmente acompanhado de um sentimento de superioridade. Uma sensação de tristeza que surge ao testemunharmos o sofrimento de outras pessoas. Porém, não permitimos ligação, não tomamos qualquer providência sobre as causas daquele sofrimento. Não ajudamos, não oferecemos ajuda, nem sequer uma prece. Simplesmente viramos as costas com um gosto amargo na boca, com um certo alívio pela nossa “superioridade”, ou com medo de que aquilo poderia um dia acontecer conosco. Procuramos esquecer o assunto e voltamos ao que estávamos fazendo no nosso dia-a-dia.
Compaixão é compartilhar a dor e fazer alguma coisa. Testemunhar o sofrimento de outra pessoa e colocar-se ao seu lado, oferecer ajuda, uma palavra, uma prece, um abraço. Estar junto, como ser humano.
Lembro de uma história que ouvi sobre dois recém nascidos, um casal de gêmeos. Após o nascimento prematuro, um dos bebês estava forte e saudável. O outro, a menina, estava fraca e correndo sério risco de não sobreviver a mais um dia. Seus sinais de vida na incubadora da UTI estavam cada vez mais pálidos e irregulares. Assistindo a sua luta pela vida se esvair e sem ter mais o que fazer, uma enfermeira seguiu o seu coração e resolveu colocar os dois bebês na mesma incubadora. Depois de algum tempo juntos, coincidência ou não, o movimento do bebê saudável resultou em um abraço carinhoso em sua irmã, já quase sem vida. E assim ficaram os dois, abraçados por longas horas. De modo quase mágico, e maravilhoso, os sinais vitais da menina começaram a melhorar. Ela começou a responder ao tratamento e recuperou as forças. Hoje os dois são crianças saudáveis, brincando e sonhando com um futuro cheio de felicidade. Os jornais da época estamparam na primeira página a foto “do abraço que salva”, “do abraço da vida”, “do abraço da compaixão”.
Portanto, que nós também tenhamos compaixão. Que possamos lembrar, e nunca esquecer, daquele sentimento bom que já nasceu dentro de nós e que a frieza da vida adulta muitas vezes transforma em “pena”.
Lembre-se que todos nós temos problemas. Muitas vezes colocamos o foco e damos tanta importância ao nosso problema que, ao dedicarmos nossa atenção total a ele, o transformamos em um gigante de sete cabeças cuspindo fogo pelas ventas. Nesse momento, em especial, é importante confiarmos em uma força muito maior que qualquer problema e que irá vencer nossas batalhas por nós. É importante dedicarmos algum tempo para compartilhar e ajudar nos problemas de outras pessoas. Assim, você verá seus problemas por uma perspectiva diferente. Perceberá seu tamanho real.
Tenha certeza que todos os sentimentos ruins associados ao seu problema irão se transformar, através da compaixão, em um sentimento de próposito e felicidade.



Marcos Pontes
Colunista, professor e primeiro astronauta profissional lusófono a orbitar o planeta, de família humilde, começou como eletricista aprendiz da RFFSA aos 14 anos, em Bauru (SP), para se tornar oficial aviador da Força Aérea Brasileira (FAB), piloto de caça, instrutor, líder de esquadrilha, engenheiro aeronáutico formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), piloto de testes de aeronaves do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), mestre em Engenharia de Sistemas graduado pela Naval Postgraduate School (NPS USNAVY, Monterey - CA).

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