01.
Como se deu a escolha ou indicação para ser
o primeiro astronauta brasileiro?
A escolha, na verdade, foi uma seleção feita
pela Agência Espacial Brasileira, num concurso público
nacional feito em 1998. A Agência Espacial tinha assinado
um contrato com a Nasa para a participação
brasileira na Estação Espacial Internacional,
precisava de um tripulante e foi feito esse concurso nacional.
Eles colocaram os requisitos de currículo, depois
foram feitos todos os exames médico, físico,
psicotécnico e entrevista, seguindo exatamente a
mesma receita, mesma seleção feita pela Nasa,
inclusive a Agência Espacial Brasileira utilizou do
processo de seleção e das pessoas de seleção
da Nasa para que eu fosse selecionado em 98.
02.
Quantos anos se preparou para ser astronauta e cosmonauta?
Eu me preparei, eu fiz o curso inicialmente de 98 até
2000 e depois eu fiquei em treinamento operacional ou manutenção
operacional de 2000 até 2005 pra finalmente realizar
o vôo na Rússia em 2006.
03.
Quais as diferenças maiores na preparação
de astronauta nos Estados Unidos e cosmonauta na Rússia?
A preparação de astronauta e cosmonauta é
muito parecida. Diferencia logicamente o equipamento, diferencia
a língua, no restante a metodologia é muito
parecida, principalmente pela existência hoje em dia
da Estação Espacial Internacional que praticamente
torna homogêneo esse treinamento porque a utilização
dos sistemas é tudo padronizado, então o treinamento
ficou muito parecido, de um e de outro.
04.
No caso de comunicação, é ainda ensinado
o Código Morse?
Não, o Código Morse não é mais
utilizado, não existe essa necessidade, caso a gente
queira aprender só por curiosidade, existe a disposição
na parte de rádio amador um cursinho de Código
Morse, mas não é mais utilizado então
a gente não aprende Código Morse.
05.
Quais as maiores dificuldades encontradas nesse treinamento
e o seu maior desafio?
Acho que uma das maiores dificuldades é coordenar
o tempo na organização das coisas, das atividades
próprias e coordenar com a família também,
porque a gente fica muito tempo afastado da família.
Essa eu acho que é a maior dificuldade. Em termos
técnicos, no início logicamente que cada um
de nós chega na turma de astronautas, eu sou da turma
17 da Nasa, a primeira turma foi aquela turma do John Glen,
do Alan Shapper e assim por diante. Então essa era
a turma primeira, a minha turma é a turma 17, turma
pingüins de 98, tínhamos 32 elementos, hoje
em dia temos só 30, perdemos dois infelizmente, um
por acidente e outro que saiu por problema de saúde,
mas a nossa turma continua lá na Nasa onde eu permaneço
trabalhando para o Programa Espacial Brasileiro, e cada
um de nós tem a sua especialidade, vamos dizer assim.
Por exemplo, eu vim da Força Aérea, então
tinha o treinamento da Força Aérea, o que
me facilitou em muitos aspectos. Mas uma das minhas dificuldades
próprias e cada um tem a sua própria dificuldade,
no início era a parte de natação, porque
eu nunca fui bom de natação. Então
quando eu cheguei ali eu tive que aprender com meus amigos
lá, que nadavam bem, como sobreviver, nas sobrevivências,
na água. Então essa foi uma das minhas dificuldades
no começo. Na Rússia, obviamente uma das dificuldades
grandes, além da quantidade de trabalho e isso tudo
que eu tinha que fazer, uma das coisas também era
a língua, que eu tive que aprender russo em três
meses, o que, que pra qualquer um que conhece a língua
russa sabe que é uma tarefa que não é
fácil, exige bastante dedicação.
06.
O que representa o Programa Espacial Brasileiro para o Programa
Espacial Brasileiro o primeiro vôo espacial e as experiências
realizadas? Foram dentro da Estação Espacial
Internacional?
Sim, a missão centenário da Agência
Espacial Brasileira da qual eu tive a felicidade de ser
o tripulante, poderia ser o Serguei Wolkov, o russo, também
o tripulante da estação, da missão
centenário, mas graças a Deus eu estava em
condições excelentes, tanto físicas
quanto técnicas pra execução da missão,
então eu fui, o Serguei Wolkov não foi. E
essa missão ela teve como objetivo a realização
dos experimentos colocados pela Agência Espacial Brasileira,
assim como divulgação do programa. Seus objetivos
foram plenamente cumpridos, a missão espacial, a
missão centenário foi o maior marco do Programa
Espacial Brasileiro em toda a sua existência desde
1961 quando nós temos atividades espaciais aqui,
foi sem dúvida nenhuma o evento mais marcante positivamente
de tudo isso infelizmente nós tivemos eventos marcantes
negativamente também, como o acidente em Alcântara
mas a missão centenário foi uma coisa muito
positiva, foi a coisa mais marcante do Programa Espacial
Brasileiro. Hoje em dia nós temos milhões
de crianças, jovens no país, jovens profissionais
também, que se dedicam a querer uma carreira em ciência
e tecnologia graças à motivação
que veio dessa missão, os experimentos também
tiveram resultados muitos positivos. Hoje em dia nós
temos, por exemplo, dois experimentos de Santa Catarina,
na Universidade Federal de Santa Catarina, que já
eram experimentos tecnológicos, já tem explicação
direta no resfriamento e controle de satélite, é
uma coisa que a gente nunca tinha conseguido fazer, hoje
em dia a gente tem isso aí já pronto graças
a essa missão e isso pode entrar no mercado, tanto
nacional quanto internacional, que é o principal,
colocar o Brasil como exportador de alta tecnologia, nessa
área é uma coisa extremamente importante e
também nunca foi conseguido em nenhuma data, em nenhuma
época, em nenhum tipo de programa, em nenhum tipo
de projeto do Programa Espacial Brasileiro. Então
a missão, sem dúvida nenhuma, foi muito boa,
a idéia da Agência Espacial Brasileira em fazer
essa missão foi excelente e eu tive a felicidade
de poder tripular essa missão.
07. Como o senhor pretende contribuir para o Programa
Espacial Brasileiro?
Eu contribuo pro Programa Espacial Brasileiro há
oito anos, tanto com a minha experiência com outras
15 agências, diferentes experiências em negociação
internacional, experiência em sistemas, experiência
em divulgar o programa e tudo isso que a gente aprende durante
esse período no exterior. Eu sou a pessoa que mais
conhece o programa da Estação Espacial Internacional,
eu tenho conhecimento tão bem na estrutura interna
da Nasa, da estrutura interna da agência japonesa,
da agência russa, etc, que facilitam em muito as nossas
conversações com esses organismos. Então
como eu já venho contribuindo depois do vôo,
quando o comando aeronáutica decidiu me colocar na
reserva porque isso era extremamente importante pra utilizar
completamente as minhas qualificações para
o Programa Espacial e em prol do próprio comando
da aeronáutica. Então o comando da aeronáutica
julgou que a melhor posição pra mim era ficar
na reserva e continuar trabalhando no programa dessa forma,
pra não ficar limitado às restrições
impostas pela lei militar, que certamente era como ter um
avião de caça guardado no hangar. Então,
o comando da aeronáutica inteligentemente me transferiu
para a reserva e depois disso a minha participação
no programa espacial ampliou muito antes desse evento, antes
do vôo e antes de ser colocado na reserva. Eu trabalhava
simplesmente no programa da Estação Espacial
Internacional. Hoje em dia eu participo do programa espacial,
do programa da estação espacial internacional.
Eu participo do programa dos veículos lançadores,
de foguetes suborbitais, desenvolvendo propriamente líquido
e do satélite Sara, todos esses do comando da aeronáutica.
Não só na parte técnica, mas principalmente
no ramo de cooperações tanto no setor político
quanto no setor internacional, coisa que só foi permitido
a mim na posição de civil, então isso
aí foi um ganho muito grande para o nosso comando
aeronáutica e para o programa espacial.
08.
O que levou o senhor a passar para a reserva, quais são
suas ambições ou planos futuros?
Bom, isso eu acabei de responder na última questão.
O comando da aeronáutica achou que era melhor, acertadamente
me transferiu para a reserva, porque assim eu posso utilizar,
completamente sem restrições das leis militares
da ativa, das minhas qualificações, conhecimento
pro programa espacial e pros projetos do comando da aeronáutica.
Hoje em dia eu estou muito feliz nessa posição,
muito feliz em poder contribuir para o programa espacial,
poder contribuir para o comando da aeronáutica, poder
contribuir para o Brasil que é o mais importante
de tudo isso porque, sem dúvida nenhuma, se todos
os cidadãos brasileiros tivessem essa consciência
da sua importância e necessidade de contribuir com
a sua parte pro desenvolvimento do nosso país, pro
desenvolvimento da nossa educação, pro desenvolvimento
das nossas crianças, da nossa juventude, certamente
hoje nós teríamos um país hoje muito
melhor que não dependesse simplesmente de ações
de um ou de outro, mas sim do trabalho conjunto de toda
uma comunidade. Que nós não perdêssemos
tempo em discussões inúteis a respeito de
assuntos que não nos cabe. É que nós
prestássemos atenção exatamente no
que nós, como ser humano, como indivíduo pudéssemos
fazer para a sociedade como um todo. Então acredito
que um dia a gente vai chegar nesse nível de desenvolvimento
cultural no país, é pra isso que eu luto,
é pra isso que eu levo a minha palavra, até
às vezes falando assim parece como se fosse um pastor
aí pelo, pelo nosso país, tentando justamente
melhorar a nossa educação, e essa é
a minha ambição futura, justamente, ter um
país na qual a gente possa dizer que a educação
é a principal base do desenvolvimento, e que através
dela todos os nossos jovens, de forma homogênea, no
país todo, tenham o direito e a capacidade, o direito
de sonhar e a capacidade de realizar os seus sonhos.
09. O senhor chegou a sair da nave espacial e ficar dentro
da estação internacional ou fora do espaço
sideral?
A gente, durante todo o tempo nós ficamos dois dias
dentro do Soyus, que é a nave russa e depois acoplamos
na estação espacial, ficamos oito dias dentro
da estação espacial e depois mais cerca de
cinco horas dentro do Soyus pro regresso, não foi
necessário nenhum tipo de atividade extracurricular
embora eu seja um astronauta qualificado pra atividades
extraveiculares com o traje americano. Eu tenho muitas horas
de treinamento na piscina pra esse tipo de atividade, mas
não foi necessário nenhum tipo de atividade
extraveicular durante o tempo que eu estava lá na
estação espacial.
10. Suas considerações finais...
Eu gostaria de agradecer a todas as perguntas, eu gostaria
de dizer da minha satisfação em conhecer uma
organização como a ESG e as ADESGs, que participam
do desenvolvimento do país, através de discussões
saudáveis e produtivas, dos problemas e soluções
principalmente que atinjam e possam resolver casos que possam
resolver problemas de extrema influência dentro da
nossa sociedade, que esse trabalho seja reconhecido pelo
público, e podem contar comigo pra esse tipo de divulgação,
podem contar comigo com as minhas idéias também
e tudo que for necessário pra pegar essa nossa bandeira
que significa cada um de nossos cidadãos aqui no
Brasil que representa cada cidadão no Brasil e levá-lo
ao espaço quantas vezes for necessário. Eu
continuo a disposição tanto do Brasil quanto
da humanidade, na função de astronauta que
em suma, é um dos representantes da humanidade fora
desse planeta. Então, estou à disposição
do Brasil, estou à disposição de cada
pessoa do Brasil, com a minha vida, como eu sempre fiz,
e eu espero que as pessoas entendam uma coisa muito simples:
essa é a maneira de como eu vejo meu país,
eu gostaria de saber como a maneira, qual é a maneira
que o país me vê. Muito obrigado.