ENTREVISTA

“O BRASIL TINHA PRAZOS E NÃO CUMPRIU”

O tenente-coronel Marcos César Pontes, 43 anos, operou oito pesquisas brasileiras a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês). Em palestra ontem na UFPE, ele falou sobre a experiência e disse que vai voltar ao espaço.

JORNAL DO COMMERCIO – Dos experimentos que o senhor conduziu, qual teve melhor resultado?
MARCOS CÉSAR PONTES – Ainda não recebi o relatório com o resultado das pesquisas, mas a mais interessante de se ver foi a do Cempra (Centro de Pesquisas Renato Archer, do MCT). Era uma mistura de proteínas que reagiam em ambiente de microgravidade e ficavam florescentes. E eu estava com uma câmara de alta resolução lá para registrar. Os outros eu não consegui ver nada e estou super curioso para saber.


JC – O senhor projetou uma peça para a ISS. Chegou a vê-la funcionar?
PONTES – Não. Os protótipos ainda estão sendo trabalhados pelo Senai-SP e a Agência Espacial Brasileira (AEB) está em conversação com a Nasa. Em breve haverá uma reunião em Huston sobre isso. Estou há oito anos neste projeto esperando que minha peça brasileira chegue lá. É bom lembrar que a participação brasileira não se resume à produção de peças. Por trás disso há todo um desenvolvimento da indústria nacional, que se qualificará para vender tecnologia de uma vez só para os 15 países que fazem parte da ISS, além do Brasil.


JC – Por que a Aeronáutica colocou o senhor na reserva? Tem a ver com as denúncias de que cobrava para realizar palestras e vendia suvenires pelo seu site na internet?
PONTES – Lógico que não. Isso foi uma decisão do Comando da Aeronáutica porque a FAB tinha um acordo com a AEB para me manter em Houston, nos Estados Unidos, até quando tivesse perspectiva de vôo. Terminado o vôo, este acordo acabou. Foi justamente numa época em que o meu trabalho em Houston se fez necessário para ajudar na negociação entre a AEB e a Nasa em relação à ISS. Tínhamos 33 peças e cedemos 27. O Brasil tinha prazo para cumprir e não cumpriu. A Nasa, então, começou a passar os projetos para a indústria americana.


JC – Depois do vôo, qual sua participação no programa espacial brasileiro?
PONTES – Minha missão agora é tentar aplicar um modelo mais novo de relacionamento de projetos entre os setores público, a exemplo do que tem sido usado nos EUA e no Japão. Não querendo fazer trocadilho com meu nome (risos), mas hoje eu funciono como uma ponte entre o setor privado e os projetos de governo. Estou ainda me ligando ao setor privado – isso está em andamento – mas em breve devo estar vinculado à Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), trabalhando em projetos como os do foguete brasileiro VLS e das peças brasileiras para a ISS.

 

Fonte: Jornal do Commercio
Data: 22/09/2006