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2006, o ano em que um brasileiro viveu uma odisséia no espaço

Edilson Saçashima
Da Redação

Do vôo kamikaze da cadela Laika à explosão do ônibus espacial Columbia, a corrida espacial sempre foi um acontecimento que os brasileiros acompanharam apenas como espectadores à distância. Não mais. Em 2006, Marcos Pontes ganhou o direito de afirmar que o espaço deixou de ser uma imagem na tela de televisão para se tornar uma experiência real. Ele se tornou o primeiro astronauta brasileiro.

Sua missão teve início no Cazaquistão, na manhã de quinta-feira, 30 de março. Exatamente às 8h30m18s (23h30m18s de quarta-feira, em Brasília), a nave Soyuz TMA-8 partiu da base de lançamento de Baikonur com o brasileiro e outros dois astronautas como tripulantes.

Foram dois dias de uma viagem pouco confortável (os astronautas ficaram praticamente imóveis no interior da nave russa) até chegar à Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês), cerca de 350 km, em linha reta, do solo terrestre. Um avião de passageiros, por exemplo, viaja a cerca de 10 km do chão.

Pontes foi o primeiro a entrar na Estação Espacial. Deslizou até o compartimento principal, desenrolou uma bandeira brasileira e sorriu. Em sua bagagem de 15 kg ainda levou um chapéu Panamá idêntico ao de Santos Dumont. Essa não era a única referência ao "pai da aviação". A missão do brasileiro foi batizada de "Centenário" em homenagem aos 100 anos do vôo do 14 Bis de Alberto Santos Dumont pelo céu de Paris, completados em 2006.

Nos oito dias em que esteve na Estação Espacial, o brasileiro realizou oito experiências científicas. Analisou o efeito da microgravidade em enzimas e no DNA, fez testes para estudar um dispositivo de transferência de calor e para aprimorar o conhecimento sobre controle térmico para satélites. Porém, a realização do experimento de germinação de sementes de feijão, proposto por estudantes da rede pública de ensino de São José dos Campos (SP), ganhou maior destaque, sendo transmitido pela Internet.

Nenhum desses testes é inédito, o que gerou críticas entre aqueles que consideram a missão irrelevante para a ciência. Outros, como o físico Marcelo de Oliveira Souza, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, acreditam que a importância está na divulgação científica, na capacidade da missão despertar o interesse da criança para a astronomia e outras áreas do conhecimento.

Para os cofres brasileiros, a missão representou um gasto de cerca de US$ 10 milhões. Segundo a AEB (Agência Espacial Brasileira), o valor é a metade do preço "real" de uma missão do gênero. O desconto se deve a uma parceria entre Brasil e Rússia, um dos países envolvidos no projeto da Estação Espacial.

Para Marcos Pontes, 43, a jornada de dez dias no espaço foi o auge de uma trajetória que começou em junho de 1998, quando seu nome foi escolhido pela AEB e pela Nasa (Agência Espacial Norte-americana). Desde então, o tenente-coronel da Força Aérea Brasileira se mudou para Houston (Texas, EUA) para realizar uma série de treinamentos no Johnson Space Center, até ser declarado astronauta em 2000.

Pontes, que começou a carreira profissional como auxiliar de eletricista, tem 25 anos de estudo e títulos de mestre em engenharia de sistemas, de engenheiro aeronáutico, piloto de provas, piloto militar e oficial de segurança de vôo.

Ao aterrissar na Terra, Pontes mais uma vez mostrou a bandeira brasileira. Na atmosfera terrestre, ele sentiu o gosto de ser uma celebridade. Em Bauru (SP), sua cidade natal, só conseguiu se locomover no meio da multidão com a escolta de cerca de 20 policiais militares. Em alguns dias, seria visto em um programa dominical de televisão como jurado de um concurso de dança.

O astronauta declarou que poderia se candidatar a algum cargo político "se achar que isso é a melhor maneira de servir o Brasil". Na última entrevista coletiva antes de embarcar para o espaço, Pontes citou a coincidência de sua missão ser a 13ª da história para a Estação Espacial. Já em órbita, seu primeiro contato com a Terra foi com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No hemisfério sul do planeta, Lula anunciou o então novo ministro da Defesa, Waldir Pires, enquanto Pontes via seu pé de feijão germinar no espaço.

Alguns meses depois, em setembro, uma iraniana se tornou a primeira turista espacial. Durante sua viagem, Anouseh Ansari viu a Terra azul, tal como Yuri Gagarin mencionou em 1961. Gagarin também é o nome que batiza a plataforma de lançamento em Baikonur de onde a nave de Pontes partiu. Ao observar a Terra do espaço, Ansari afirmou que não viu fronteiras dividindo o planeta. Na sua bagagem não havia a bandeira do Irã.

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Na retrospectiva de 2006 da UOL:
- tudo sobre a missão
- fotografias
- filmes

 

 

Fonte: UOL
Data: 01/01/2007