Lembrando
da história. Vinte e três de outubro de 1906.
Primeira decolagem autônoma de um veículo mais
pesado que ar. Alguma dúvida? Tecnicamente não
existe qualquer polêmica quanto a esse fato. Assim
como, quero crer, não existe qualquer dúvida
quanto à criatividade, coragem, capacidade, determinação
e inovação do “nosso” Santos Dumont.
Existem comentários maldosos, críticas negativas,
idéias influenciadas, etc. Todas escritas por aproveitadores
que usam do poder com as palavras para terem “o seu
momento de glória”. É claro. Isso sempre
existirá. Todos nós, brasileiros, sabemos
disso. |
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Hoje
em dia, como claro se faz pela história que perdura
às críticas, Santos Dumont é o nosso
herói da aviação. Desconhecido em grande
parte do mundo, e algumas vezes criticado pelos próprios
compatriotas, até hoje não teve o seu real
lugar na aeronáutica mundial. Merece muito mais do
que uma escondida lembrança no “famoso”
Smithsonian Museum em Washington DC. Merece seu verdadeiro
reconhecimento internacional, apesar dos críticos.
Ao menos essa é a minha opinião e, por essa
razão, sinto enorme orgulho da posição
que me encontro hoje.
Daqui
há pouco mais de um mês estarei decolando com
a bandeira do Brasil pela primeira vez para o espaço.
Ano de 2006. Cem anos da decolagem de Santos Dumont. Certamente
não é necessário falar o que significa
isso. Todos nós, brasileiros, sabemos disso.
Aqui, Star City, Moscou, nove horas da noite. Silêncio
e solidão. Meus fiéis companheiros dos últimos
tempos. Noites frias. Gráficos, cálculos,
preparação, cansaço. Procuro distração
lendo as notícias que recebo do Brasil.
Três semanas. Esse é o tempo que falta para
a viagem ao Cazaquistão, última parada antes
da decolagem.
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Nesta semana conclui com sucesso a fase de treinamento
para pouso na água, sobrevivência e resgate
na água. Muito interessante, e apertado! Tente
tirar um traje espacial dentro de uma cápsula
com três pessoas. Depois, se isso não
bastar, coloque três roupas de sobrevivência,
uma sobre a outra, sendo a última de borracha.
Realmente um aperto! Cair na água depois de
tudo isso nunca foi tão refrescante. |
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Conclui
também a fase de treinamento em aeronave para
simulação de microgravidade. Já
tinha feito desses vôos em Houston. No final,
depois de 2 vôos e mais de 20 manobras completas,
frustrei a todos que esperavam que eu passasse mal
com as parábolas e variações
de fator de carga. Fazer o quê? A gente acaba
acostumando com todas essas turbulências e expectativas
negativas dos “amigos” na vida. O vôo
só é um retrato mais resumido. Coisa
metafórica! |
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Fizemos
também um treinamento interessante com máscara
de gás. Simulamos um incêncio na EEI
que, como resultado, nos forçou a abandonar
a estação utilizando máscaras
de gás. Até aí, tudo bem. Colocar
o traje Sokol usando máscara exige um certo
grau de familiaridade com a roupa e seus acessórios.
Não dá para ver nada! Depois, seguimos
para a cápsula de descida do Soyuz e simulamos
uma descida em emergência. O treinamento foi
muito bom em termos de exigir conhecimento, determinação
e espírito de equipe entre a tripulação. |
Excelente!
Aliás, não dá para falar muito
com as máscaras. Precisa mesmo é agir.
Rápido.
As atividades andam a todo vapor
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Lá
fora, a neve cai intensamente. A estrada para o espaço
continua branca. Estarei passando por ela pelas últimas
vezes nas próximas semanas aqui na “Cidade
Estrelada”. No dia 18 de março, sábado,
Pavel, Jeff e eu sairemos daqui a bordo de um avião
militar russo com destino à base de lançamento
de Baikonur, no Cazaquistão. Lá, continuaremos
nosso treinamento isolados de todos, pelos últimos
dias que antecedem a nossa decolagem. Um tipo de “quarentena
de 11 dias”.
Nesse período teremos mais aulas de sistemas,
treinamento fisiológico, práticas de
emergências, testes de trajes espaciais e equipamentos,
exames médicos, provas teóricas e práticas
sobre todos os sistemas e procedimentos.
Os dias serão de concentração
intensa. Não há espaço ou tempo
para erros. Muito menos para dúvidas e discussões
teóricas.
Haverá uma coletiva de imprensa no dia 28 de
março. Terei a chance de ver minha família.
Depois disso, silêncio e solidão.
Finalmente, no dia 30 de março, após
a contagem regressiva em russo, quase 200 toneladas
de combustível, distribuídas nos 3 estágios
do foguete serão acesas, em uma ação
simples e decisiva, sem muitas palavras, sem retorno,
propulsionando a bandeira brasileira e milhões
de corações pela primeira vez fora desse
planeta. |
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